O desenvolvimento de alguns trabalhos de fotografia pode demorar anos. O processo, que não costuma ser linear, vem permeado de momentos de incerteza, frustração, desânimo (ao menos por aqui costuma ser assim…). No meio desse caminho, é comum fazermos pausas, repensarmos, escrevermos e nos ajudarmos. Hoje, resolvemos aproveitar esse espaço de comunicação com vocês para compartilhar algumas anotações que fizemos sobre o novo trabalho que o Marcelo vem desenvolvendo desde que finalizou o Abrigo, em 2020.
(Amores impiedosos)
A fotografia me ajuda a acessar aquilo que se passa em minha alma. Desde que me fiz fotógrafo foi assim e, no momento em que me tornei pai não foi diferente. Foi por meio dos meus registros que vi as leis da maternidade tomando meu lar e, de acordo com essas leis, me apropriei de minha própria paternidade.
Foram as imagens que me mostraram o momento em que me despedi de minha parceira, a mulher que daria lugar à mãe, e foram também minhas imagens que ostentaram a potência dessa transformação. Sem a fotografia, talvez eu não tivesse visto que o corpo de um filho é um pedaço arrancado da carne e da alma de sua mãe. Talvez eu não tivesse compreendido que essa amputação há de ser avassaladora, de turvar a realidade, de adoecer as certezas. Foi nos olhares da recém nascida mãe que desvendei a força, o cansaço e as súplicas de amor – um amor tão impiedoso quanto aquele do qual ela mesma era alvo. A maternidade é lei dos bichos.
Essas imagens são parte de minha pesquisa sobre as transformações que se originaram com o nascimento de meu filho. Já há alguns anos trabalho, usando a fotografia, em investigações decorrentes de meus processos íntimos e pessoais. Não significa que eu pretenda, com meu trabalho, expor objetivamente aquilo que me aconteceu. Busco transcender tais acontecimentos de modo a acessar aquilo que é característico da natureza humana, das leis da natureza ou – ainda maior, pelo que tenho percebido – da maternidade.
(imagens Marcelo Greco)
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Helena Rios e Marcelo Greco