“O principal objetivo do escritor não é o que ele escreve. Sua necessidade primeira é escrever, isto é, ausentar-se do mundo e de si mesmo para, eventualmente, fazer disso a matéria de elaborações literárias. É apenas num segundo momento que se põe a questão do “tema” a ser tratado. O tema é a condição necessária, necessariamente contingente da produção de escritos. Não importa qual tema é o melhor, desde que ele permita escrever. Durante seis anos, até 1946, eu mantive um diário. Escrevia para conjurar a angústia. Não importava o quê; eu era um escrevedor. O escrevedor só se tornará um escritor quando a sua necessidade de escrever for sustentada por um tema que permita e exija que essa necessidade se organize num projeto. […]”
André Gorz. Carta a D. História de um amor.*
Hoje, em nossa primeira carta do ano, resolvemos compartilhar com vocês esse trecho do livro Carta a D., do André Gorz, porque encontramos nele uma nova maneira de falar sobre algo que muito nos interessa. O que significa ser um autor? Do que se trata a autoria na fotografia?
Já pararam para pensar nessa diferença que Gorz aponta, entre escrevedor e escritor? Se trouxermos a reflexão para o trabalho com fotografia: já pararam para pensar na diferença entre fazedor de imagens e fotógrafo? Conhecemos mais fotógrafos ou fazedores de imagens? É possível sermos, ao mesmo tempo, parcialmente fotógrafos e parcialmente fazedores de imagens?
Ser um fotógrafo – ou, como gostamos de chamar, ser um autor – tem a ver com responsabilidade, propósito, consciência daquilo que se faz, compromissos éticos. Tem a ver também com constância, dedicação, paciência, integridade. Podemos dizer que vamos nos tornando fotógrafos, ao longo do tempo, se nos mantivermos fiéis a nossos propósitos em relação às imagens que fazemos, se nos mantivermos conectados com as pessoas e com o mundo no qual estamos inseridos e soubermos perceber como oferecer nossa sensibilidade.
Não somos autores se estamos interessados unicamente em nossas questões pessoais. Um ator, de acordo com nosso pensamento, é alguém que se deixa permear pelo contexto em que vive. Ele é responsável por todas as escolhas no processo de elaboração de um trabalho – éticas e estéticas – e é integralmente responsável por aquilo que apresenta ao mundo.
As imagens são do livro Valparaiso, de Sergio Larrain. O fotógrafo prezava o caminhar sem rumo, sem objetivo, deixava que a vida apresentasse o que deveria ser visto. (Imagens extraídas do site do Atelier EXB)
* Carta a D. é um dos livros do projeto de clube de leitura – de livros de fotografia e literatura – que está sendo planejado para esse semestre pela Juliana Monteiro e pelo Marcelo Greco. Logo logo traremos essa e outras novidades.
Esperamos que vocês estejam bem e que tenhamos todos um bom ano!
…
Conhece alguém que gostaria de receber esse conteúdo? Encaminhe esse e-mail. É possível se cadastrar na nossa lista clicando aqui.
…
Helena Rios e Marcelo Greco