O livro traz 36 fotografias do ensaio de estréia do fotógrafo André Cunha, que recebeu a Menção Honrosa no ‘Prêmio Brasil Fotografia 2016’. Em busca de pessoas vivendo afastadas da sociedade convencional, André deparou-se com uma família que vive no Sul do Brasil, seguindo um modo de vida pouco comum. Dentro do universo retratado, onde muitos enxergariam escassez, André Cunha enxergou potência e beleza.


fotografias. André Cunha
realização. Monica Paes
direção artística e projeto gráfico. rios.greco
texto. Marcelo Greco
tradução. Romulo Osthues
tratamento das imagens. Estúdio 321, São Paulo
impressão e acabamento. IPSIS Gráfica e Editora
tiragem. 1000 exemplares


Máscaras múltiplas

Estamos aqui, neste presente distendido, em busca de luzes que não nos deixem ser esquecidos. O mundo das aparências se consagrou. Vivemos na superfície, surfando nas ondas virtuais, distantes da camada de lama que percorre nossos rios. O fundamental é fingir ser. No universo virtual, esse é o jogo. O modelo de vida “álbum de família” se estabeleceu. Tudo é perfeito, limpo, feliz. Adesivamos máscaras de bem-estar permanente, iludimos e somos iludidos, movidos pela angustiante busca do extraordinário. Caso contrário, ficaremos para trás, à margem.

Nesse complexo e paranoico universo da aparência, acabamos sendo acorrentados por padrões que determinam o comportamento. Para os obedientes, a permanente felicidade; para os transgressores, o isolamento, a castração. 

Talvez, a escapatória para esse baile de máscaras esteja no resgate de uma vida poética. Mas o que isso significa? Qual o sentido desse resgate nesse mundo tecnológico, asséptico, superficial e banal, distante das dores da carne e da vida real? A vida poética se faz da nossa capacidade de enxergar o ordinário, sombrio aos olhos do mundo das aparências, e encontrar nele a luz da experiência mais plena. A beleza do simples. A vida poética se faz ao nos olharmos no espelho e vermos quem somos, sem as máscaras que criamos para os outros e que acabam por nos iludir também.

O termo “santuário” representa, na religião, um local sagrado de peregrinação e culto. Na perspectiva ecológica, designa um lugar de proteção para um biótopo.

Existe também um santuário interno que se faz quando conseguimos entrar em contato com o que há de sublime nas coisas simples da vida. Gozar da delicadeza dos momentos ordinários, buscar dignidade em quem realmente somos e, assim, para além das máscaras, tentar viver com integridade nossos valores e crenças. Seguramente, seremos cobrados por essa escolha. Por isso, é necessário sermos verdadeiros, fortes, resistentes.

Nestes encontros com nossos próprios santuários, algo nos toca, emociona, mesmo que não saibamos muito bem o porquê. As máscaras continuam a existir, mas podemos, ao mesmo tempo, sentir e tocar a espessura da realidade.

Marcelo Greco